GESTÃO

Aprendizagem em Foco - Gestão Escolar

Nº 12 - jun.2016

Escolha de diretores escolares deve contemplar princípio da gestão democrática

>> PNE determina que nomeação de diretores considere mérito, desempenho e consulta à comunidade

1

>> Princípio democrático fortalece gestão voltada para resultados de aprendizagem

2

>> Práticas de gestão democrática devem fazer parte da rotina dos gestores

3

ermina em 25 de junho de 2016 o prazo para o cumprimento da meta 19 do Plano Nacional de Educação, que fala em “assegurar condições (...) para a efetivação da gestão democrática da Educação”. Esta é uma pauta antiga de diversos atores do campo educacional. Ganhou força durante o processo de redemocratização nos anos 1980 e sua menção como princípio que deve reger os sistemas de ensino no artigo 206 da Constituição de 88 – reiterado no artigo 3º da Lei de Diretrizes e Bases – é considerada uma conquista.

Na redação da meta, fica clara a intenção dos legisladores de buscar um equilíbrio entre um formato de seleção de diretores que considere tanto “critérios técnicos de mérito e desempenho” quanto “a participação da comunidade escolar”. A forma como cada sistema irá implementar esta diretriz, porém, pode variar muito, o que torna esta uma das metas de mais difícil monitoramento do PNE.

Em 2011, a Fundação Victor Civita divulgou pesquisa encomendada ao Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado (Cedhap) que procurou traçar um panorama das práticas de seleção e capacitação de diretores existentes no país a partir de informações fornecidas pelas próprias redes. Na fase quantitativa do estudo, responderam ao questionário 24 das 27 secretarias estaduais e 11 secretarias municipais.

A pesquisa constatou que a eleição é a principal forma de acesso ao cargo, sendo mencionada por 67% das SEEs; a indicação aparece em segundo lugar (42%). Em metade das redes estaduais, são combinadas duas ou mais modalidades: um terço delas informou utilizar critérios técnicos para seleção de diretores, como provas, exames de certificação, entrevistas e concursos.

Na literatura nacional sobre o tema, vale destacar ainda o estudo da Fundação Itaú Social, de 2015, sobre o processo de seleção de diretores nas escolas públicas brasileiras. A investigação concluiu que “processos seletivos mais transparentes (vinculados a exame de seleção e/ou eleição) (...) em geral escolhem diretores que permanecem muito mais tempo nas escolas e que apresentam características de liderança positivas (como identificado pelo incentivo à formação continuada dos professores)”, o que não se verifica no caso dos diretores indicados.

As desvantagens

Embora não haja evidências incontestáveis de qual a melhor ou mais adequada forma de nomeação de diretores, o certo é que a indicação política é a modalidade menos recomendada, pelo seu caráter autoritário e antidemocrático. A condução ao cargo neste formato, sem a explicitação de critérios técnicos que tenham fundamentado a decisão, pode dificultar a aceitação do gestor pela equipe e pela comunidade, comprometendo sua capacidade de liderança e mobilização.

A experiência dos estados mostra, porém, que o simples fato de o diretor ser escolhido por eleição não é garantia inequívoca de uma gestão democrática na prática, e mesmo este processo democrático pode vir acompanhado dos piores vícios do processo politico. No estudo da Fundação Victor Civita/ Cedhap, tanto as secretarias como os diretores entrevistados apontaram como desvantagens desse processo a indução à prática de clientelismo, corporativismo ou favoritismo no ambiente escolar e a politização e fragmentação de grupos nas escolas, provocando um clima de antagonismo.

É por isso que o texto do PNE busca dirimir os aspectos negativos de cada modalidade, propondo que o processo de nomeação se dê de forma híbrida, conjugando mérito, desempenho e consulta à comunidade escolar. Além do respaldo de alunos, pais e professores, é igualmente importante que o gestor apresente perfil técnico para desempenhar a função, demonstrando ter as competências e habilidades que o cargo de gestor exige.

 

Sabe-se que um bom diretor é aquele que combina competências humanas, técnicas e políticas, em vista do que essas três dimensões de seu trabalho devam ser observadas, não sendo possível fazê-lo adotando exclusivamente uma modalidade ou outra de seleção.

Uma das conclusões do estudo Práticas de Seleção e Capacitação de Diretores Escolares, da FVC/Cedhap

Primeiro passo

Embora não assegure que a gestão seja democrática, a escolha do diretor que contemple a participação dos atores escolares constitui um primeiro passo para que ela se efetive. Ao assumir o cargo com respaldo da comunidade escolar, o gestor ganha legitimidade para exercer esse papel de liderança. Ao mesmo tempo, contribui para que ele estabeleça uma relação de compromisso e parceria com aqueles que o elegeram.

O princípio da gestão democrática que fundamenta a eleição de diretores deve fazer parte do dia a dia do gestor. O próprio plano estabelece nesta meta várias estratégias que buscam trazer para o cotidiano da escola – e não apenas no momento de escolha do diretor – práticas que induzam a uma gestão democrática. Ela se concretiza na adoção de processos de tomadas de decisão coletivas, na construção participativa do projeto político-pedagógico e na instalação de instâncias de participação dos atores escolares, como fóruns, associações de pais e mestres, conselhos escolares e grêmios estudantis.

Impacto sobre a aprendizagem

Além da prerrogativa constitucional, pesa em favor da gestão democrática sua relação positiva com a aprendizagem, apontada em diversos estudos. É o caso, por exemplo, da Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis) de 2013, realizada pela OCDE com dados de 34 países, incluindo o Brasil, que constatou que professores que afirmaram trabalhar em escolas com alto nível de participação de estudantes, dos pais e do corpo docente nas decisões escolares reportaram em menor proporção enfrentar problemas de indisciplina em sala de aula. O estudo conclui que “promover a participação dos atores nas decisões escolares, combinado com uma cultura de responsabilidade compartilhada e apoio mútuo, pode contribuir para um ambiente de aprendizagem mais positivo”.

No livro "Leading School Turnaround" (Liderando a Virada na Escola), de 2010, o pesquisador Kenneth Leithwood, da Universidade de Toronto, no Canadá, enumera várias pesquisas que destacam que gestores que conseguiram reverter a situação em escolas com baixo desempenho apresentam como práticas em comum o estímulo à inovação na equipe e o compartilhamento de sucessos e fracassos. Eles também estão sempre abertos ao diálogo, e procuram envolver professores, pais, alunos, funcionários e a comunidade nos processos de mudança, comunicando constantemente os objetivos comuns a serem alcançados coletivamente.

Desafios da função

O debate sobre qual a melhor forma de escolher os diretores escolares traz à tona a discussão sobre qual o perfil necessário para o exercício do cargo. O cargo caracteriza-se pela sua complexidade, já que envolve competências de diferentes naturezas, como saber liderar, ser capaz de acompanhar e apoiar os processos de ensino e aprendizagem e gerir com eficiência recursos humanos e financeiros disponíveis.

As experiências das redes têm demonstrado que o gestor eleito não necessariamente apresenta as condições para o exercício da função. Nesse sentido, é fundamental que as redes não só incluam nos mecanismos de seleção a adoção de critérios técnicos que permitam verificar se o candidato dispõe de competências necessárias como estabeleçam como requisito para permanência no cargo o compromisso com os resultados de aprendizagem dos alunos, considerando tanto a proficiência como o fluxo. Cabe às secretarias, por sua vez, oferecer apoio aos gestores, oferecendo formação continuada que efetivamente contribua para o enfrentamento dos desafios inerentes à função.

 

PARA SABER MAIS

  • Entrevista com Cleuza Repulho sobre gestão democrática (vídeo), Canal Futura (2015): https://youtu.be/_a13nWelrbE
  • Improving School Climate and Students’ Opportunities to Learn, Boletim Teaching in Focus nº 9, OCDE (jan/2015) (em inglês): bit.ly/TeachingFocus9
  • Leading School Turnaround, Kenneth Leithwood/Alma Harris/Tiuu Strauss (2010)
  • Mapeamento de práticas de seleção e capacitação de diretores escolares, Cedhap/Fundação Victor Civita (2011): bit.ly/pesquisaCedhapFVC
  • O Processo de Seleção de Diretores nas Escolas Públicas Brasileiras, Paula Pereda (FEA/USP)/ Andrea Lucchesi (EACH/USP)/ Fundação Itaú Social (2015): bit.ly/pesquisaFISdiretores

 

BAIXAR PDF DESTA EDIÇÃO

Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco. Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.

 

Clique aqui e receba o boletim Aprendizagem em Foco. Para fazer algum comentário,
envie um e-mail para: instituto.unibanco@institutounibanco.org.br