Redes preparam ações de enfrentamento à evasão na volta às aulas
Segundo estudo realizado pela Fundação Roberto Marinho e pelo Insper e divulgado nesta semana, os 17,5% dos jovens que não concluirão o Ensino Médio – um contingente de 575 mil adolescentes de 16 anos – representam para o País uma perda de R$ 214 bilhões por ano. O cálculo foi feito com base no impacto econômico da queda da empregabilidade e de remuneração dos jovens, nos efeitos dessa renda mais baixa para a sociedade e na longevidade menor.
Dados da Pnad Contínua 2019 que acabam de ser divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reforçam a necessidade de se dedicar atenção especial ao problema do abandono escolar. Mais da metade da população de 25 anos ou mais de idade (51,2%) não concluíram a última etapa da educação básica. O problema se acentua na passagem do Ensino Fundamental para o Médio, já que o índice de jovens de 15 anos que não estavam na escola (14,1%) quase dobra em relação ao dos adolescentes de 14 anos (8,1%). A pesquisa evidencia ainda as desigualdades regionais e de cor/raça, apontando índices piores no Nordeste e entre pretos e pardos.
Especialistas e gestores alertam para o agravamento do problema da evasão decorrente do período prolongado de fechamento das escolas. Ainda que as redes tenham implementado o ensino remoto para fazer frente à interrupção das atividades presenciais, questões de diversas ordens podem ter impedido os alunos de dar continuidade aos estudos ou dificultar seu retorno à sala de aula.
Um dado de pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) e divulgada no último mês de junho indica que o temor é pertinente: três em cada 10 jovens de 15 a 29 anos pensam em deixar os estudos quando as escolas e universidades reabrirem, após suspensão das aulas devido à pandemia do novo coronavírus. O estudo aponta ainda que questões emocionais, como estresse e ansiedade, dificuldade de se organizar para estudar em casa, ausência de contato presencial com os professores e de ambiente adequado para realização das atividades estão entre as principais dificuldades assinaladas pelos estudantes durante esse período de ensino remoto.
As redes e escolas já vêm realizando ações em meio à pandemia na tentativa de impedir que os alunos se afastem dos estudos, conforme abordamos em reportagem publicada anteriormente. Cientes do desafio de manter todos os estudantes mobilizados após um período prologado de paralisação das atividades presenciais, as secretarias de Educação já estão formulando, para a retomada das aulas, ações voltadas especificamente para combater a evasão e o abandono. Segundo levantamento feito Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), o Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa (CTE-IRB) e 26 Tribunais de Contas brasileiros, 79% das 232 redes municipais e todas as 17 redes estaduais participantes do estudo afirmaram ter alguma estratégia para evitar o abandono no retorno das aulas.
A pesquisa do Iede, CTE-IRB e TCEs lista ainda algumas das principais ações mencionadas pelas redes. Uma delas é a busca ativa dos estudantes faltantes. A prática é recomendada no parecer produzido pelo Conselho Nacional de Educação sobre a volta às aulas e consta também no documento produzido pelo Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed) que traça diretrizes nacionais para elaboração de protocolos de reabertura das escolas.
Alagoas
É o que será realizado pela rede estadual de Alagoas, segundo a secretária de Educação Laura de Souza. Ela explica que cada uma das 13 gerências regionais de ensino existentes na rede construirá seu plano de busca ativa.
“Esse trabalho vai ser capitaneado pelas gerências regionais porque a gente entende que a evasão tem muito a ver com o território. O aluno da zona rural evade por um motivo, o da capital, por outro motivo”, explica.
Ela conta ainda que o estado contará com a parceria do Fundo das Nações Unidas para Infância e Adolescência (Unicef), que já conta com um programa de busca ativa, e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) no desenho de estratégias para o combate à evasão e ao abandono. “Que as prefeituras nos apoiem com esses agentes comunitários locais que possam fazer essas visitas [às casas dos estudantes] e que as escolas tenham um controle diário de frequência para que a gente possa se antecipar quando o aluno começar a faltar”, afirma.
Laura relata ainda que a Secretaria já obteve um feedback positivo quando começou a pagar o auxílio alimentação aos estudantes. “Então, acreditamos que esse tipo de ação vai ajudar a manter o vínculo do estudante com a escola”, complementa.
Goiás
Em Goiás, a Secretaria de Educação também está trabalhando na formulação das diretrizes gerais para a rede referentes à retomada das atividades presenciais. A necessidade do desenvolvimento de ações pelas unidades escolares voltadas ao combate à evasão está presente no documento.
“Fizemos o mapeamento dos riscos e um dos maiores riscos é a questão da evasão”, destaca a Superintendente do Ensino Médio da Seduc-GO, Osvany Gundim da Costa Cardoso.
A Secretaria também realizou um trabalho de monitoramento constante da participação dos estudantes nas atividades de ensino remoto por meio de um sistema alimentado por tutores responsáveis pelo acompanhamento das escolas.
As escolas também estão sendo orientadas a se articular com outras instituições do território, como Conselho Tutelar, e realizar a busca ativa dos estudantes. “Para que possam verificar como estão esses estudantes em aspectos de saúde, emocionais”, explica Osvany.
Segundo a Superintendente, será realizado o escalonamento das turmas e séries no processo de reabertura das escolas, mas os estudantes que não participaram das atividades terão prioridade no retorno.
França
Olhar para o contexto internacional e verificar como alguns países que já retomaram as aulas presenciais organizaram esse retorno e lidaram com a questão da evasão também pode trazer inspirações na formulação de medidas aderentes à nossa realidade.
Na França, o Ministério da Educação Nacional e da Juventude divulgou um protocolo de reabertura para as escolas que, dentre outras medidas, define que os alunos que tiveram dificuldade em participar da educação remota realizada durante o período de fechamento das escolas devem receber atenção especial neste momento, devido aos riscos de evasão escolar. Para atender melhor aos alunos com dificuldade, o protocolo recomenda formar, se possível e necessário, grupos de assistência especial e acionar professores substitutos para conduzir as atividades.