Redes promovem troca de experiências mesmo em tempos de distanciamento social
Aproveitar o potencial de sua equipe, estimulando a troca de práticas entre professores, é uma das recomendações mais frequentes para gestores. Em tempos de distanciamento social, fazer isso continua importante, mas há o desafio do isolamento. Por meio da internet, alguns sistemas educacionais estão conseguindo incentivar o diálogo e o compartilhamento de experiências exitosas.
Em Goiás, por exemplo, a rede estadual criou a plataforma Gestão Escolar, peça-chave na estratégia de ensino a distância após o fechamento das escolas. Além de dados sobre a participação dos alunos e sobre os recursos didáticos utilizados em cada escola, a nova plataforma tem uma seção chamada Fórum de Discussão. É lá que os tutores da rede goiana − profissionais que diariamente entram em contato com as unidades de ensino em todo o estado − postam relatos e vídeos de iniciativas bem-sucedidas.
Mais de mil boas práticas já foram disponibilizadas desde o início da pandemia de covid-19. “São muitas ideias e muitas cabeças pensando. É ótimo, você conversa com gente do estado inteiro”, diz o tutor Leandro Rodrigues Vieira, do município de Itumbiara, a cerca de 200 quilômetros de Goiânia. “O que uma escola faz pode ser a solução para outra.”
Na capital paulista, a Secretaria Municipal de Educação também incentiva as comunidades de prática. Na Diretoria Regional de Educação Campo Limpo, professores e coordenadores pedagógicos trocam experiências em três frentes: um site recém-criado, grupos de WhatsApp e a plataforma Microsoft Teams.
“O compartilhamento de práticas é o nosso maior trunfo neste momento. Nossa mensagem é que somos uma rede, que é comum ter dúvidas e que não existe receita pronta. Faz diferença as pessoas perceberem que nós, formadores, também não temos todas as respostas: estamos remando a partir do mesmo lugar”, diz a supervisora Cristina Barroco Massei Fernandes.
Segundo ela, os professores costumam expressar três tipos de dúvidas: questões técnicas (como gravar uma videoaula ou utilizar a plataforma de aprendizagem), de conteúdo (qual a melhor forma de ensinar determinado tema remotamente) e de inclusão digital (como atingir maior número de alunos).
Motivação
Na rede estadual de Goiás, os tutores servem de ponte entre as escolas e as regionais de ensino, isto é, entre o chão da sala e as decisões tomadas pela Secretaria de Educação. Leandro, que monitora quatro escolas, conta que já repassou aos coordenadores pedagógicos pelo menos duas recomendações que surgiram a partir de postagens do fórum virtual.
Uma delas foi orientar pais de alunos a avisar a escola sempre que seus filhos ficassem impossibilitados de acessar as atividades on-line − por motivos como a queda no sinal da internet ou uma falha no celular.
Outra ideia foi motivar os alunos de manhã cedo com mensagens de WhatsApp. “O conforto de casa pode fazer com que a gente relaxe, ainda mais se está chovendo ou fazendo um friozinho. Então, a professora dá bom dia, diz para tomar banho, vestir o uniforme, pentear o cabelo, passar um perfuminho e arrumar um cantinho bom para estudar”, conta Leandro. Numa das escolas que adaptou a ideia, Leandro diz que a professora passou a enviar também um áudio com o sinal da sirene da escola. “E os alunos gostaram”, diz.
Leandro cita ainda como exemplo uma prática pedagógica que foi compartilhada e replicada uma videoaula de língua portuguesa sobre gêneros textuais. Ao tratar do gênero reportagem, a professora valeu-se de uma notícia sobre a covid-19. “A orientação é linkar o conteúdo das aulas com o contexto da pandemia.”
A assessora de gestão pedagógica da Gerência de Tutoria Educacional de Goiás, Vanusa Batista de Oliveira, destaca a importância da interação: “O Fórum de Discussão oportuniza debates e questionamentos que provocam reflexão, adequações e correções de rota, se e quando estas se fizerem necessárias”, diz ela.
A troca de experiências não acontece apenas mediada pela secretaria. No âmbito das escolas, há também experiências exitosas mesmo no atual contexto. Na Escola Estadual Doutor Ornelo Machado, em Jaraguá, a 120 quilômetros de Goiânia, Nicole Cardoso Avelar leciona português e ciências para turmas dos anos finais do ensino fundamental. Ela conta que os professores criaram um grupo de WhatsApp para tirar dúvidas. “Um vai colaborando com o outro”, diz ela, lembrando que os docentes também têm a oportunidade de participar de videoconferências com os coordenadores pedagógicos.
Postura propositiva
Para que a interação seja a mais produtiva possível, a supervisora Cristina Fernandes, de São Paulo, recomenda uma postura propositiva, com perguntas e sugestões. “Que todos atuem na perspectiva da melhoria de ideias. Uma mediação amiga, que só diz que está tudo bom, ou aquela negativa, que só busca defeitos, não tira as pessoas do lugar”, diz ela, que supervisiona a formação de coordenadores pedagógicos, professores de matemática e de tecnologia para aprendizagem.
Na rede paulistana, os estudantes também são incentivados a interagir entre si e buscar soluções para os desafios do ensino remoto. “Temos uma aluna que fez um tutorial, dizendo como encontra o seu e-mail do Google Sala de Aula e acessa as atividades que seus professores estão postando. É uma linguagem de criança para criança, ou entre adolescentes”, conta Cristina.
Veja os melhores momentos do depoimento de Cristina Fernandes.
No Espírito Santo, a rede estadual lançou o projeto IdeAção, concebido para qualificar a prática pedagógica a partir da experiência dos professores. Por meio de edital, a Secretaria de Educação convidou os docentes a encaminhar suas videoaulas sobre diferentes áreas do currículo do ensino fundamental e médio. Uma comissão está fazendo a curadoria das videoaulas, que passarão a compor um repositório.
“A proposta é valorizar o que é da rede, para a rede”, diz a gerente de Estudos, Pesquisas, Qualificação e Desenvolvimento dos Profissionais do Magistério, Mariana Pozzatti. Depois disso, haverá uma segunda rodada de produção, dessa vez com estúdios e equipamentos fornecidos pela secretaria.
De acordo com Mariana, os professores da rede capixaba também trocam experiências por meio da plataforma Google Sala de Aula, no âmbito de cada regional de ensino. A comunicação se dá também por grupos de WhatsApp e outros aplicativos. “É difícil mensurar o tamanho das comunidades de prática, porque elas se fazem de diferentes maneiras”, afirma ela.